Brasil: Um líder climático em um mundo de contradições

A liderança climática do Brasil, apesar das complexidades

Ana Clara Toledo e Mariana Ribeiro

Brasil: Um líder climático em um mundo de contradições

Este artigo vem do nosso escritório Purpose Brazil, um líder no espaço climático do país, pressionando por um futuro mais sustentável para todos nós.

É seguro dizer que o Brasil conquistou seu espaço no cenário global no último ano. Fomos o país com a maior delegação na COP 28, fizemos discursos poderosos na ONU e orquestramos parcerias multilaterais. Agora, estamos nos preparando para sediar o G-20 e, em 2025, sediaremos a COP 30 em Belém. No entanto, a liderança do Brasil no espaço climático não é isenta de contradições. Embora o desmatamento na Amazônia esteja diminuindo, ele continua devastador no Cerrado, uma vasta ecorregião de savana tropical no leste do Brasil. Vizinhos como a Colômbia se comprometem a acabar com a proliferação de combustíveis fósseis, enquanto o Brasil realizou recentemente o maior leilão de petróleo e gás de sua história. Como o país pode liderar globalmente em um campo em que nossas ações internas ainda são tão inconsistentes? Para garantir que essa liderança seja coerente, justa e ousada, podemos recorrer às lições aprendidas com o trabalho do Purpose Climate Lab no Brasil. Elas estabelecem as bases importantes necessárias para aumentar nossa ambição e ação climática nos próximos anos.

Brasil: Um líder climático em um mundo de contradições

1. Fortalecimento das bases para a ação

Nos últimos três anos, grande parte do trabalho do Purpose Climate Lab no Brasil concentrou-se no fortalecimento de organizações de base na Amazônia, capacitando-as a liderar campanhas para mudanças narrativas e de políticas públicas em seus territórios. Colaboramos com mais de 30 organizações e hoje temos uma rede de mais de 100 ativistas locais trabalhando em pesquisa, construção de estratégias, criação de narrativas, produção de conteúdo e intervenções impactantes. Antes de criar grandes campanhas na Amazônia, era essencial entender o ecossistema existente: quem já estava nele, quais esforços precisavam ser fortalecidos e quais vozes precisavam ser amplificadas. Ao colaborar com organizações lideradas por jovens, mulheres, negros e indígenas, ajudamos a estruturar uma sociedade civil que hoje assume papéis de liderança no movimento climático e está pronta para se envolver em níveis local, regional e nacional. Essa base sólida é fundamental para a crescente proeminência dessas vozes na arena climática.

2. Da cidade ao vilarejo: Trabalhando com organizações diversas

Nossos maiores projetos na Amazônia foram desenvolvidos por meio de chamadas abertas, que permitiram que organizações de todos os estados e territórios se candidatassem. A primeira lição que aprendemos foi que há um enorme potencial: quanto mais sabemos, mais há para descobrir. A segunda é que essas chamadas abertas nos permitiram selecionar uma diversidade de organizações – de associações de trabalhadores rurais a coletivos indígenas, grupos urbanos e comunidadesquilombolas. Essa diversidade trouxe uma riqueza de intercâmbio e expansão da parceria. Essa combinação de iniciativas destacou os pontos concretos de uma identidade amazônica compartilhada, que se tornou a base para a ação conjunta e talvez o ingrediente mais crucial para a expansão dos movimentos locais.

3. Narrando a mudança que queremos

Nesses anos, aprendemos que as práticas estão profundamente ligadas às narrativas. A maneira como vemos e agimos no mundo está intimamente ligada às histórias que conhecemos e nas quais acreditamos. Declarações como “o petróleo trará empregos e desenvolvimento para nossa cidade” ou “floresta em pé não traz dinheiro” não são apenas retóricas – elas constituem a base ideológica que busca justificar práticas como desmatamento, mineração ilegal e outras formas de violência e opressão. Portanto, ao conduzir projetos e campanhas com nossos parceiros, damos atenção especial à compreensão das narrativas que envolvem o tópico. Procuramos identificar as vozes que representam diferentes perspectivas e discursos, com o objetivo de fortalecer as histórias e as pessoas que nos conduzem a um futuro mais habitável e justo. O trabalho da Casa de Mensagens é um ótimo exemplo da concretização desse valor.

4. Identificação de problemas locais para gerar mudanças estruturais

Ao construir nosso relacionamento com o ecossistema da região amazônica, identificamos que uma importante contribuição do Purpose Climate Lab foi o compartilhamento de ferramentas para o desenvolvimento de estratégias de campanha que permitiram que as organizações estivessem presentes em espaços estratégicos para o desenvolvimento de políticas públicas. Incentivamos os grupos a identificarem problemas climáticos específicos em seus territórios e a buscarem soluções que destravassem as políticas locais. Como resultado, surgiram campanhas que exigiam a criação de ciclovias, conselhos ambientais, projetos de lei para garantir os direitos dos rios e mecanismos para proteger o meio ambiente e a vida dos protetores de território. Esses esforços locais têm o potencial de gerar mudanças estruturais que vão muito além de suas comunidades, influenciando políticas públicas em escala regional e nacional.

Uma chamada para ação

O Brasil está em um momento crítico em sua liderança climática. As contradições que enfrentamos não podem ser ignoradas, mas devem ser enfrentadas de frente, com coragem e coerência. O trabalho realizado até o momento pelo Purpose Climate Lab no Brasil nos mostra que, para liderar de forma justa e ousada, precisamos fortalecer nossas bases, abraçar a diversidade e narrar as mudanças que queremos ver. Agora, mais do que nunca, é hora de transformar essas lições em ações concretas. Convidamos todos que compartilham dessa visão a se juntarem a nós na construção de um futuro mais sustentável e justo para todos.